ão há linha de chegada. Nem vencedores. A estratégia para ter sucesso no mundo dos negócios exige constância e pensamento a longo prazo, como num jogo que não tem final. Essa é a visão do especialista em gestão e liderança Simon Sinek, autor do livro O Jogo Infinito (Sextante). De acordo com ele, há os jogos finitos, nos quais as regras são claras e os jogadores entendem quando a competição está acabando; e os infinitos, com regras que mudam o tempo todo e com participantes desconhecidos que chegam do nada – bem como o mundo em que vivemos hoje.
O grande problema, diz Simon, é que, embora as empresas estejam vivendo o jogo infinito, as lideranças estão com a mentalidade do jogo finito – e aí as coisas não dão certo. Segundo ele, os resultados dessa mentalidade são familiares: demissões em massa para se adequar a projeções arbitrárias, ambientes de trabalho com permanente ameaça de corte, práticas desonestas e antiéticas, premiação de profissionais tóxicos (mas com alto desempenho) e recompensa a líderes que parecem cuidar muito mais de si mesmos do que de sua equipe.
Para uma companhia ser bem-sucedida no jogo infinito dos negócios, é preciso parar de manter o foco em quem vence ou em quem é o melhor e começar a pensar sobre como montar empresas que sejam fortes e saudáveis para permanecer no jogo por muitas gerações. “Temos de sair da competição e entrar na colaboração”, diz Claudia Cavallini, consultora e professora na HSM Educação Executiva. Mas mudar esse padrão de pensamento exige preparo. Não se trata de uma chave que se altera de uma hora para outra. “Demanda desenvolvimento constante e disposição para largar as regras do jogo”, afirma a consultora.
Olhar para dentro
Possuir uma mentalidade infinita tem relação direta com um processo de auto-observação e autoconhecimento. O profissional deve se perguntar por que está onde está, de que maneira tem realizado suas atividades e o que gostaria de alcançar com seu trabalho. Isso porque, de acordo com Simon, o cargo que um executivo ocupa é um jogo finito, a questão é como transformá-lo em um papel infinito.
“É preciso pensar no que você quer oferecer para a empresa além dos resultados práticos e de que maneira pode influenciar seu time a trabalhar para esse objetivo”, diz Cinthia Alves, psicóloga especializada em desenvolvimento humano e mudança de comportamento. A mentalidade infinita está relacionada ao próprio desenvolvimento da maturidade psicológica emocional, segundo Marco Brito, country director da The Leadership Circle no Brasil, parte do Full Circle Group, organização global que trabalha o desenvolvimento de lideranças. “O líder precisa se perguntar quem é e qual é seu papel, principalmente diante de um mundo que muda constantemente”, diz.
A adaptabilidade acompanha Michele Martins, vice-presidente de RH da Neoway, empresa especializada em big data, desde o início da carreira. A executiva nunca chega com projetos prontos, com um conceito já desenhado: busca ser flexível e aberta para trabalhar, tendo em mente que a adaptação é constante. “Se vou lançar um programa de jornada de carreira, por exemplo, no modelo tradicional levaria seis meses para construir o projeto. No modelo ágil, lanço em períodos e em entregas curtas e, no decorrer do processo, vou adaptando o programa de acordo com as mudanças que surgem e os feedbacks das pessoas”, afirma.
Isso porque, em um mercado em constante transformação, pensar em ações prontas, sem nenhuma flexibilidade, não vai surtir os efeitos desejados. “Não podemos correr o risco de nos apaixonar por nossas ideias e ficar apegados a elas. Se eu fiz uma leitura de cenário e isso mudar no momento seguinte, preciso alterar a rota e seguir”, afirma. É essencial tirar o peso das linhas de chegada – um semestre, um mês, um projeto – e pensar a longo prazo, pois o jogo não termina ao final de um ano. “O trabalho é constante e deve mudar o tempo todo”, afirma Michele.
Ninguém sabe de tudo
“Você jamais vai jogar o jogo infinito se não for humilde”, explica Cinthia. Estar desarmado e não ter a pretensão de sempre ter a melhor resposta são comportamentos essenciais, já que a construção é sempre conjunta. “O ambiente precisa ser de questionamento, de abertura, de liberdade de expressão”, diz Cinthia.
Torna-se necessário ouvir genuinamente os funcionários, além de entender que o papel do líder é viabilizar que o trabalho da equipe aconteça e abrir espaço para que o erro seja visto apenas como parte de um processo, e não como resultado. “Pensamos em como será a experiência do colaborador, em quanto ele vai se sentir integrado à empresa e no que vai aprender com o processo”, diz Tato Athanase, gerente sênior de recursos humanos do SAS, empresa de softwares, no Brasil. Por lá, a concepção de jogo infinito é usado na gestão. No SAS Global Forum deste ano houve, inclusive, a participação de Simon Sinek. A ideia foi levar os conceitos da mentalidade infinita a todos. “Ao iniciar qualquer ação penso em sua continuidade no jogo infinito”, explica o executivo.
Segundo Tato, os projetos ou resultados podem até ser bons no curto prazo, mas, se não estiverem em sintonia com a estratégia da empresa, não fazem sentido. “É preciso entender o conceito e estar aberto a aprender sempre. A curiosidade ajuda nesse processo, além do olhar empático para a equipe”, afirma. Para ele, quando os processos são tocados de forma tradicional e presos às regras, perde-se a oportunidade de navegar para o novo. Como bem diz Simon Sinek, gestores com mentalidade infinita têm empresas mais fortes, inovadoras e inspiradoras – e que se mantêm ao longo do tempo.
Enxerga a longo prazo
Enquanto um líder com mentalidade finita trabalha para obter de seus funcionários, clientes e acionistas algo que o faça atingir métricas arbitrárias, quem tem mentalidade infinita trabalha para garantir que seus funcionários, clientes e acionistas se mantenham inspirados a continuar contribuindo. Ele quer deixar sua organização em melhor situação do que aquela em que a encontrou.
Não vê uma linha de chegada
Um chefe de mentalidade finita deseja que o jogo acabe – e precisa vencer. Por isso, joga para si mesmo e se esforça em derrotar os outros participantes. Já o que tem mentalidade infinita quer continuar jogando e olha além da lucratividade.
Pensa no todo
Quem possui mindset finito tende a seguir padrões que o ajudem a alcançar os objetivos pessoais, sem atentar para os efeitos que possam causar. Questionar “O que é melhor para nós?” em vez de “O que é melhor para mim?” é um modo infinito de pensar. Esse raciocínio considera o impacto de suas decisões em seu pessoal, em sua comunidade, na economia, em seu país e no mundo.
Está aberto ao novo
Por trabalhar com um objetivo final em mente, o gestor de mentalidade finita não gosta de surpresas: tudo o que não é capaz de prever ou controlar pode comprometer seus planos e aumentar o risco de derrota. O infinito abraça a liberdade do jogo e está aberto a qualquer possibilidade que o mantenha nele.
Trabalha pelo desempenho da empresa
O desempenho da companhia é usado pelo pensamento finito como demonstração do valor da própria carreira de um gestor. Já um líder de mentalidade infinita usa sua carreira para aumentar o valor da empresa no longo prazo.