elulares e notebooks à mão, o tempo todo. Agendas comprometidas, sem espaço para quase nada. Um assunto denso para abordar na apresentação às 16h. Só dá tempo de rever os slides e mais nada. Conecta no Teams, começa a apresentar, ninguém abre a câmera, dá um branco, logo vem perguntas que você nem imaginava que seriam feitas. Sensação de que poderia ter ido melhor. Mas não dá tempo de pensar, afinal, tem mensagem no Teams, recado no WhatsApp.
Dia seguinte começa com uma reunião presencial logo às 9h30. Conteúdo tinindo, preparado ao longo da semana, mas as pessoas estão distraídas, cada um em sua tela enquanto você está ali, passando pelas telas para chegar ao final do conteúdo. Mais uma vez uma sensação estranha de que poderia ter ido melhor, falado menos “né”, mas pelo menos você fez sua parte, cumpriu a agenda.
Cenários tão distintos entre si e tão corriqueiros na vida de profissionais das mais variadas empresas e segmentos de atuação. E olha que daria para seguir descrevendo mais uma infinidade de situações que revelam a complexidade da comunicação em meio a todas as demandas que permeiam essa habilidade tão valorizada e invisibilizada ao mesmo tempo.
Sim, porque é um consenso que comunicar faz parte da vida de todas as pessoas. O silêncio comunica, a presença ou ausência também, o que é dito e o que não é dito, o que se tem a intenção de dizer (ou não) é percebido e interpretado.
Mesmo que onipresente, nos esquecemos desses detalhes que tanto importam e impactam os sentidos do que fazemos e dizemos e das relações que estabelecemos com as pessoas.
Pode parecer um detalhe estar no celular, só pra ver se tem alguma mensagem, enquanto uma pessoa apresenta sua mensagem, com toda a carga emocional e reputacional envolvida nesse papel. Mas basta uma pessoa fazer isso para as demais serem picadas pela vontade de fazer a mesma coisa. E eis que ali está a pessoa em pé falando sozinha e solitária.
Pode parecer um detalhe mudar a abordagem daquele conjunto de slides que já vem sendo apresentado em outros contextos, até porque dá trabalho, de mais ou menos tempo. Mas começar de uma forma diferente, preparar uma mensagem final para as pessoas que estão ouvindo pode sinalizar a reverência e o cuidado de que tanto sentimos falta nas interações. Quem sabe possa até adiar aquela espiadinha no celular… Ou evitar perguntas que nos desconcertam, porque já antevemos questões e objeções quando paramos para pensar no contexto.
Entre tantos outros detalhes que poderia listar, enfatizo um que é fundamental. A comunicação “em” público é também “para” o público e começa muito antes do momento diante das pessoas. Pressupor os bastidores e as outras pessoas na ação de comunicar é quase redundante, mas, na prática, não é. É dar luz para aquilo que vem sendo invisibilizado: os efeitos do contexto e do que e como se diz nas pessoas.
Estar ciente disso não significa que controlamos o que acontece ou como as pessoas entendem o que dizemos. Agir de forma mais intencional ao comunicar para o público significa organizar as agendas de forma a contemplar momentos de planejamento, de reflexão antes e após as apresentações. Organizar eventos e reuniões em locais, horários e formatos que deem vazão às necessidades e aos objetivos do encontro, de forma a favorecer a comunicação (não apenas o estar “presente”). Em outras palavras, é visibilizar os bastidores que impactam muito no desempenho diante das plateias, pequenas ou não, presenciais ou online e desenhar experiências produtivas para todas as partes envolvidas.
Sem essa mudança de perspectiva, seguimos acreditando que a boa comunicação depende de postura adequada, ausência de nós, gestos bem pensados, como se isso garantisse um bom desempenho.
Vivemos tempos complexos. O fim da pandemia evidenciou o desafio já sentido na época de câmeras fechadas: lidar com a dispersão e a necessidade mais intensa de comunicação em seu sentido amplo e profundo. Dar luz não apenas à técnica pela técnica e ao palco, e sim aos bastidores e às plateias é o caminho para não só valorizar, mas visibilizar e vivenciar a comunicação em outro patamar. Quem apresenta e quem assiste têm muito a ganhar. Aceita o desafio?