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Pessoas são mais felizes quando vivem o presente, dizem pesquisadores

Em Dopamina — A Molécula do Desejo, pesquisadores investigam como a busca por prazer e satisfação influencia nossas atitudes, inclusive no trabalho

Por Redação
Atualizado em 5 jul 2023, 16h30 - Publicado em 7 abr 2023, 08h20
Homem de óculos escuros está sorrindo ao lado de um cachorro caramelo
 (Leandro Fregoni/Unsplash/Divulgação)
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A

dopamina, neurotransmissor ligado a sensações de prazer, nos leva a desejar o que ainda não temos e a buscar o novo, dizem os especialistas Daniel Z. Lieberman e Michael E. Long no recém-lançado livro Dopamina — A Molécula do Desejo (Sextante). Mas esse processo também pode se virar contra nós: ao colocarmos a mente sempre no futuro, em busca da próxima conquista, perdemos o essencial, que é o presente. E, quando deixamos de perceber o aqui e agora, colocamos em risco aquele que talvez seja o objetivo final de tanto esforço: a felicidade. Leia mais no trecho a seguir

Trecho do livro

Apesar de os viciados em tecnologia acreditarem nisto, a multitarefa é algo impossível. Quando você tenta fazer mais de uma coisa ao mesmo tempo, como falar ao telefone enquanto lê um e-mail, desloca sua atenção entre as tarefas e acaba prejudicando ambas. Às vezes você faz uma pausa enquanto lê o e-mail para ouvir a pessoa no telefone; outras vezes para de ouvir enquanto se concentra no e-mail. A pessoa com quem está falando percebe a sua desatenção e você perde detalhes importantes. Em vez de aumentar sua eficiência, a “multitarefa” a diminui.

Aza Raskin, especialista em experiência do usuário e designer-chefe do navegador Firefox 4, dá um exemplo. Soletre em voz alta, letra por letra, a frase “joias são brilhantes” e ao mesmo tempo escreva seu nome. Quanto tempo levou? Agora soletre em voz alta “joias são brilhantes” e ao terminar escreva seu nome. Quanto tempo levou? Provavelmente cerca de metade do tempo que gastou na “multitarefa”.

Você também comete mais erros quando tenta realizar várias tarefas ao mesmo tempo. Interrupções de apenas alguns segundos, o tempo que leva para espiar a sua caixa de e-mails e voltar, podem dobrar o número de erros que você comete em uma tarefa que exija concentração. Não é somente a distração que causa os erros; alternar tarefas consome energia mental e a fadiga dificulta a concentração. Ainda assim, as pessoas fazem isso, sobretudo as que trabalham com computadores.

Um estudo realizado na Universidade da Califórnia em Irvine, em colaboração com a Microsoft e o Instituto de Tecnologia de Massachusetts, rastreou os hábitos de trabalho de indivíduos que passam a maior parte do dia on-line. O tempo médio que gastavam em uma tarefa antes de passar para outra foi de apenas 47 segundos. Ao longo do dia, eles alternaram entre as tarefas mais de 400 vezes. Aqueles que dedicavam menos tempo a uma ação antes de pular para a próxima tinham níveis mais altos de estresse e rendiam menos — já que repetiam a manobra de “trocar tarefas” 400 vezes em vez de apenas uma vez após a conclusão de cada tarefa. Além de diminuir a produtividade, altos níveis de estresse também causam fadiga e esgotamento.

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O alto custo de vida no futuro

Viver nossa vida no mundo abstrato, irreal e dopaminérgico das possibilidades futuras tem um custo, e esse custo é a felicidade. Pesquisadores da Universidade Harvard descobriram isso desenvolvendo um aplicativo de smartphone que solicitava aos voluntários que fornecessem relatórios em tempo real de seus pensamentos, sentimentos e ações enquanto realizavam suas atividades diárias. O objetivo do estudo era aprender mais sobre a relação entre uma mente errante e a felicidade. Mais de 5 mil pessoas de 83 países se ofereceram para participar.

O aplicativo entrava em contato com os participantes, em horários aleatórios, para solicitar informações como “O que você está fazendo agora?”, “Como está se sentindo agora?” e “Você está pensando em algo diferente do que está fazendo no momento?”. Independentemente do que estivessem fazendo, as pessoas respondiam “sim” à última pergunta na metade das vezes. Todas as atividades produziram a mesma quantidade de divagações mentais, exceto sexo, muito bom para manter a atenção no presente. Nas demais situações, porém, pensar em coisas diferentes acontecia com tanta frequência que os pesquisadores concluíram que uma mente errante, o que os cientistas chamam de pensamento independente de estímulos, era o modo padrão do cérebro.

Ao analisar a felicidade, os cientistas descobriram que as pessoas se sentiam menos felizes quando sua mente estava divagando e, uma vez mais, independentemente da atividade. Quer estivessem comendo, trabalhando, assistindo à TV ou interagindo com outras pessoas, sentiam-se mais felizes quando prestavam atenção no que estavam fazendo. Os pesquisadores concluíram que “a mente humana é uma mente errante, e uma mente errante é uma mente infeliz”.

A Pietà, de Michelangelo, que retrata a Virgem Maria embalando seu filho morto, comunica poderosamente ideias abstratas de luto e aceitação. Mas foi preciso um bloco de mármore para que o artista realizasse sua concepção. A triste beleza de Maria é uma representação idealizada da feminilidade, mas Michelangelo não poderia ter concebido essa imagem se não tivesse usado seus olhos para estudar mulheres reais e suas emoções, e assim sentir uma tristeza real no aqui e agora.

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Ao vivermos no presente, absorvemos informações sensoriais sobre a realidade, permitindo que o sistema dopaminérgico use esses dados para desenvolver planos de maximização de recompensas. As impressões que absorvemos têm o potencial de inspirar uma enxurrada de ideias, aumentando nossa capacidade de encontrar novas soluções para os problemas que enfrentamos. O que é uma coisa maravilhosa. Criar algo novo, algo que nunca foi concebido antes, é, por definição, surpreendente. Por ser sempre nova, a criação é o mais duradouro dos prazeres dopaminérgicos.

Estimule a criatividade

Marcenaria, tricô, pintura, decoração e costura são atividades antiquadas que não recebem muita atenção no nosso mundo moderno — e esse é exatamente o ponto. Tais atividades não exigem smartphones nem internet de alta velocidade: exigem cérebro e mãos trabalhando juntos para criar algo novo. Nossa imaginação concebe o projeto. Desenvolvemos um plano para realizá-lo. Então nossas mãos o tornam real.

Um executivo que trabalha em serviços financeiros passava seus dias meditando sobre opções de ações, derivativos, taxas de câmbio e outras feras imaginárias. Ele era rico e infeliz. Sua infelicidade o levou a consultar um especialista em saúde mental. Alguns meses depois, ele redescobriu sua paixão pela pintura, um hobby que abandonara décadas antes. “Não vejo a hora de chegar em casa no fim do dia”, disse ele ao médico. “Ontem à noite pintei durante quatro horas e nem notei o tempo passar.”

Nem todo mundo tem tempo ou inclinação para aprender a pintar, mas isso não significa que criar beleza esteja fora de alcance. Livros de colorir para adultos surpreenderam alguns e satisfizeram muitos. À primeira vista, parecem bobos; por que adultos precisariam de livros para colorir? Mas esses livros têm a capacidade de aliviar o estresse, pois representam uma fuga de um mundo desequilibrado e dopaminérgico.

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Consertar objetos aumenta nossa eficiência e nossa sensação de controle. Cozinhar, dedicar-se à jardinagem e praticar esportes estão entre as muitas atividades que combinam estimulação intelectual e atividade física de um modo que nos satisfaz e nos completa. Essas atividades podem ser realizadas durante a vida inteira sem se tornarem obsoletas. Você pode garantir alguns dias de emoções dopaminérgicas comprando um caro relógio suíço. Logo, porém, ele passa a ser apenas um relógio. Ser promovido a gerente torna o trabalho emocionante no começo, mas logo vira a rotina de sempre.

Mas a maioria das pessoas não se envolve em atos criativos, como desenhar, compor música ou construir aeromodelos. Não há nenhuma razão de ordem prática para fazer essas coisas. São difíceis, pelo menos no início, e provavelmente não nos garantirão dinheiro, prestígio nem um futuro melhor. Mas podem nos fazer felizes.

O poder está em suas mãos

Em 2015, a TINYpulse, empresa de consultoria que ajuda gestores a aumentar o engajamento do quadro funcional, entrevistou mais de 30 mil funcionários de mais de quinhentas empresas. Os pesquisadores fizeram aos entrevistados perguntas sobre seus gestores, seus colegas de trabalho e suas expectativas de crescimento profissional. Mas o que a pesquisa realmente pretendia era descobrir seu nível de felicidade.

Portanto, analisaram o nível de felicidade em uma ampla gama de atividades, inclusive os glamourosos setores de tecnologia, finanças e biotecnologia. Nenhum deles ocupou as primeiras posições. As pessoas mais felizes eram os trabalhadores da construção civil.

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Esses trabalhadores recebem planos abstratos e os tornam reais. Usam sua mente e suas mãos. Desfrutam um alto grau de camaradagem. Quando a TINYpulse analisou os motivos da felicidade mencionados pelos trabalhadores da construção, o mais comum foi: “Eu trabalho com ótimas pessoas.” Um gerente de construção disse: “Uma coisa que une todo mundo é que, no fim do dia, eles saem para tomar umas cervejas, relaxar e conversar sobre as coisas — boas e ruins.” Os relacionamentos sociais no ambiente profissional tiveram um papel fundamental na felicidade dos operários: uniram trabalho e amizade.

É o aguilhão da insatisfação que nos mantém em nosso trabalho enquanto outros desfrutam a companhia de familiares e amigos. Mas aqueles de nós que preferem uma vida plena e feliz têm uma tarefa diferente a cumprir: a tarefa de encontrar harmonia. Temos que superar a sedução da interminável estimulação dopaminérgica e virar as costas para nossa insaciável avidez por mais. Muita dopamina o tempo todo não é o caminho para o melhor futuro possível.

DOPAMINA — A Molécula do Desejo

Autores: Daniel Z. Lieberman
e Michael E. Long
Editora: Sextante
Páginas: 256
Preço: 59,90 reais

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Este trecho faz parte de uma reportagem da edição 85 (abril/maio) de VOCÊ RH. Clique aqui para se tornar nosso assinante

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