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Luciana Lima

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Sócia da ScienceConsulting e professora do Insper nas disciplinas de Estratégia de Negócios, Pessoas e Liderança.

Neurocoaching, neurofeedback, “neurotudo”: o reducionismo da neurociência

A proliferação do termo "neuro" nas mais diversas áreas mostra que a neurociência está sendo banalizada. Mas esse campo de estudo tem muito a ensinar

Por Luciana Lima, colunista de VOCÊ RH
16 jun 2021, 09h00
Ilustração de cérebro.
 (Você RH/Divulgação)
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Basta apenas uma rápida navegada em alguma mídia para deparar com algum assunto que destaque o termo “neuro”. Virou uma verdadeira febre. Admito que eu nunca vi tantas combinações para a palavra “neuro”: é neurocoach, neurofeedback, neurostilist, neuroarquitetura, enfim, neuro isso, neuro aquilo, neurociência relacionada aos mais diversos e inesperados temas.

Como tudo, há um lado positivo e outro nem tanto. Da perspectiva positiva, sou complemente a favor da democratização do conhecimento, ou seja, que todos possam ter acesso ao maior volume possível de informações científicas.

Por outro, gostaria de provocá-lo a refletir: qual é a fonte dessas informações? Quais as suas consequências? Quais sua real utilidade? Num mundo de fakenews e seus efeitos adversos, todos temos que buscar respostas a esses questionamentos.

Sem reducionismo

Venho estudando neurociência há, aproximadamente, oito anos. Fui em busca de respostas que nenhum outro campo científico foi capaz de me proporcionar com a tangibilidade e a profundidade que buscava. De fato, as respostas começaram a aparecer.

Entretanto, junto com elas surge a responsabilidade de como aplicar os novos conhecimentos, fugindo de modelos reducionistas, mas que ainda fizessem sentido e pudessem ser explorados na prática do dia a dia. Isso porque o reducionismo, muito discutido na ciência, também deveria ser um tema falado no dia a dia – afinal, reduzir conceitos complexos é um perigo.

É preciso respeitar a construção histórica de um campo científico. Importante saber, por exemplo, que a  neurociência teve sua década de ouro nos anos 90 – que foi conhecida como o ano do cérebro. Os países desenvolvidos inauguraram centros de pesquisas com a finalidade de investigá-la, aportando grande volume de recursos. Essas nações não fizeram isso à toa. Na verdade, perceberam a grande oportunidade alocada no potencial de resultados e impactos de todos os tipos.

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É fácil compreender os ganhos que as investigações do cérebro podem proporcionar ao mercado farmacêutico, especialmente no que tange as doenças degenerativas e o nível de envelhecimento populacional. Vamos a outro exemplo: há profissionais que sofrem com a procrastinação, que não é simplesmente uma questão de preguiça – já se sabe que tende a estar relacionada ao uma falha do funcionamento de uma rede neural chamada default. Investimentos em estudos de neurociência podem gerar resultados positivos na produtividade de uma massa de profissionais que poderão se beneficiar de performances diferenciadas.

E na área educacional? Estudos já direcionam a atenção para a sincronia entre cérebros dos professores e dos alunos. Diante dessas evidências, estratégias mais robustas e formação de professores poderão diferenciar instituições acadêmicas. E quanto ao alcance das metas organizacionais? Já imaginaram o potencial dos gestores de posse de mapas individuais de funcionamentos cerebrais?

Respeito à ciência

Dessa forma, imagino que seja essa multiplicidade de oportunidade de aplicação com possíveis resultados positivos e tangíveis que deva ter estimulado, em grande parte, essa proliferação de “neurotudo”. No entanto, retomo minha provocação: precisamos respeitar a construção do campo de estudo. Não é possível que dos anos 90 para cá os achados das pesquisas em neurociência sejam capazes de justificar o tanto de discurso e receitas prontas que tenho visto por aí. Até porque, qual a porcentagem da população que esta pronta para ler um artigo científico sobre, por exemplo, liderança e neurociência, lembrando que esse material, em geral, é internacional e escrito em inglês?

Além disso, a maior parte da literatura sobre neurociência depende da capacidade do pesquisador de transitar em diferentes campos de estudos no momento de interpretar e construir inferências factíveis dos resultados encontrados, uma vez que, estamos falando de uma ciência multidisciplinar. A robustez dos achados, até o momento, foi desenvolvida com base em experimentos com animais, relacionados, muitas vezes com doenças, síndromes, entre outros. Os estudos com humanos, pertinentes a mudanças comportamentais, estratégias para aumento de performance, desenvolvimento de competências socioemocionais, enfim, conteúdos relacionados a liderança e gestão de pessoas estão “engatinhando” a passos curtos, pois há um conjunto imenso de limitações, inclusive de bioética relacionados ao tema.

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Caminhada longa

Não há um estudo sequer que afirme, categoricamente e de forma generalizável, como lidar com essas questões. O que existe é um conjunto de evidências de funcionamentos neurais relacionados a esses aspectos que se mostram relevantes dentro da amostra estudada. Então, muita calma e pé atrás com o que você lê e interpreta em fontes que não são científicas sobre esse assunto. Nem tudo se resume ao sistema límbico, como é comumente apresentado nas receitas prontas fornecidas por aí.

Então, você deve estar me perguntando: não há uma fonte confiável sobre esse assunto? Sim, com certeza há, algumas. Observe que é uma caminhada longa, não é a leitura de um ou alguns livros, ou mesmo, de um curso de poucas horas que vai te habilitar no assunto. É preciso construir uma jornada de conhecimento.

Vou compartilhar um pouco sobre alguns elementos que fizeram, e fazem,  parte da minha rotina:

  1. Leia livros introdutórios e mais prazerosos, como os de Leonard Mlodinow
  2. Aprofunde seus conhecimento em livros técnicos, como o de Roberto Lent (não se preocupe, de tanto insistir, chegará uma hora que as “coisas” começarão a se encaixar em sua cabeça, não é uma leitura fácil)
  3. Faça um curso de curta duração em uma instituição credenciada no assunto e verifique como você se sente, como está o seu aprendizado
  4. Faça resumos, anotações e desenhe
  5. Faça um curso de longa duração, mas verifique com muito cuidado quem são os professores, qual a experiência deles na área
  6. Participe de grupos de estudo sobre a temática
  7. Fuja de sites, consultorias e profissionais com perfil reducionista do tema
  8. Tenha uma fonte científica para se manter atualizado, como por exemplo a Neuroscience News.
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Eu sempre digo que a paixão pelo conhecimento e pela ciência é um caminho sem volta, então, desenhe seu caminho, apaixone-se, mergulhe no que te interessa e crie um repertório que se sustente. E lembre-se: isso dependerá da qualidade das suas fontes de informação, seu desafio – e do mundo atual  – é justamente ter crítica quanto a sua fonte!

Assinatura de Luciana Lima
(Arte/VOCÊ RH)

 

 

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